segunda-feira, 19 de setembro de 2016 | By: Isis Cardoso

Vênus

Venus
Corpo nu na penumbra
Com um ou outro feixe de luz
Trazem o fascínio
A ponto de fazer desviar o olhar
Por mais de três

Segundos
Que separam tua tez de minhas
Roupas de loja de departamento
Na tua casa de paredes referenciadas
Eu penso em uma frase
Mas nada me vem quando eu quero

Escrever
Com a minha língua o meu nome
Na tela em branco do teu corpo esguio
Em cada pele ou cada pêlo
Ler em morse seus arrepios em minhas mãos
E venerar o teu belíssimo

Prazer
Quando meu corpo se desnuda e te preenche,
Quando você tenta acender um cigarro,
Quando te falta momentaneamente o ar
E você se deita
Com um poeta roncando no seu

Ombro
E teu corpo confortável se curva
E aquece a minha tez no cochilo
Depois de me agitar em prazeres nefandos
Ao me trazer a seu santuário
E me provares que realmente és

Vênus.
sexta-feira, 9 de setembro de 2016 | By: Isis Cardoso

Bordel

Todos os dias, a mesma frase passa por minha cabeça. "Todos os dias, penso em escrever um conto a respeito do prostíbulo ao lado do restaurante onde almoço".

Eu poderia fazer recortes sociais, tratar acerca de desigualdades, dizer o quão privilegiada e hipócrita eu seria em discorrer sobre prostituição trabalhando em um escritório para auxiliar nas despesas enquanto as mulheres capitalizam seus corpos pelo "pão nosso de cada dia"; enquanto garotinhas mimadas de internet discutem sobre prostituição ser a exploração mais brutal do sistema neoliberal ou se é a maior prova da autonomia feminina.

No entanto, o que me traz a este texto é a margem que nos separa. A linha invisível que corta a calçada da avenida. O contrato social que me impede de sequer olhar lá para dentro com meus olhos amendoados e curiosos de jovem adulta descobrindo o mundo por ser "moça de família". Mas nada pode parar minha mente quando acabo de almoçar e toca aquele Raça Negra no puteiro. Sim, puteiro, na maior imagética vulgar do vocabulário proibido a "moças de família". Um dia, toca Frank Aguiar; no outro, Pussycat Dolls... Mas, eu passando por ele ou não, o puteiro sempre está em seu pleno funcionamento.

Para uns, o antro de perdição da família tradicional; para outros, a fonte de renda. O prédio caindo aos pedaços traz as dúvidas da qualidade de condições trabalhistas naquele imóvel. Mas ele sempre está ali, esteve antes de mim e provavelmente estará depois que eu for trabalhar em outro endereço.

O pútrefe bordel talvez seja uma incógnita do impuro da própria curiosidade humana, cerceada por imposições morais e cívicas. Mas sempre olhamos para suas portas vermelhas e nos perguntamos o que há além.

Na verdade, o prostíbulo caindo aos pedaços somos nós, pedaços de desconhecimento de nossa própria mente. Aquilo lá é só um prédio mal conservado para comércios sexuais.

Plataforma 8

Preste atenção ao fechamento das portas
A linha amarela é para a sua proteção
Observe o espaço entre o trem e a plataforma
Todos deverão desembarcar na próxima estação

Estamos aguardando a liberação do tráfego
Este veículo permanecerá parado
O ramal está com intervalos irregulares
E todo dia tudo tem de similar um certo bocado

O solavanco da serpente de metal
Em cabos altos de eletricidade
E trilhos grossos parafusados

O solavanco da serpente de metal
Que com seus trilhos corta a cidade
E segue com seus vagões lotados.

Devagarinho

E posso não ser a pessoa certa
nem você
muito menos nós

Esse pode não ser o momento certo
ou depois
ou nenhum outro

Mas há algo a nosso respeito
em nossos beijos
em nossos toques

Que eu devo dizer,
enaltecer sua presença
e remoer sua falta.

Há algo entre nós,
de qualquer jeito
então deixa ser bem devagarinho até o tempo decidir.

(Este poema foi inspirado por "Something About Us" - Daft Punk)